01/07/2011
Um médico naif
Telmo Carvalho homenageou Laranjeiras em painel pintado no Instituto Nacional de Cardiologia
Por Flávia Ribeiro
Há cinco anos, o cardiologista pediátrico Telmo Carvalho passou mais de cinco meses pintando um enorme mural nas paredes da sala de espera do setor de pediátrico do Instituto Nacional de Cardiologia, em Laranjeiras. O painel, de dez metros quadrados, é uma homenagem ao local onde trabalhou por 30 anos. Mais que isso: é um tributo ao bairro de Laranjeiras e à cidade do Rio de Janeiro, na qual o médico e pintor baiano, nascido em Jequié, chegou aos 9 anos.
"O painel foi feito com grande interação com os médicos, funcionários do hospital, as crianças que passavam por lá e seus familiares. Um chegava e dizia: 'Essa igrejinha que você pintou está tão bonita, quero me casar aí'. E eu pintava um casamento. É meu trabalho mais bonito", diz ele. O que não é pouco. Telmo tem 500 quadros documentados e cerca de 30 deles fazem parte da impressionante coleção de 8 mil telas do Museu Internacional de Arte Naif do Brasil (Mian), no Cosme Velho.
Fechado ao público por falta de verba, o Mian ocupa um casarão barroco e abriga o maior acervo naif do mundo. Foi criado pelo joalheiro Lucien Finkelstein para divulgar a arte naif, conhecida por seu uma manifestação artística ingênua, espontânea e autêntica, realizada por artistas autodidatas, no Brasil e no mundo - o museu reúne trabalhos de cerca de 150 países. Mas parou de receber verbas da Prefeitura do Rio em 2004 e conseguiu se manter por alguns anos recebendo apenas visitas marcadas. Desde abril, nem mesmo essas existem. "Nenhum museu vive sem subvenção. O Mian não recebia nada, nem a iniciativa privada se interessou. Não dá para entender. Coleções naif do mundo inteiro se comunicam com o Mian, ele é referência no assunto. A filha e a neta do Finkelstein estão tentando reerguer o Mian", comenta Telmo.
Aposentado da Medicina, ele agora só se dedica à sua arte. Está preparando um livro com cerca de 50 trabalhos. Quer lançá-lo no ano que vem, quando completa 30 anos de pintura. "Estou
naifando 40 fotos maravilhosas do Pierre Verger (
fotógrafo francês apaixonado pela Bahia ), pintando em cima delas. Quero, junto com o livro, expor em cinco cidades do Brasil e na França", revela ele, que já tem livros publicados, como Memórias de um Pediatra Naif (Studio, 2009).
Eclético, Telmo também começou este ano a preparar um curta-metragem sobre o amor com a cidade mineira de Rio Pomba, onde passava férias na infância e adolescência, como cenário. "O pintor naif é autodidata, nunca frequentou escola. Pinta a própria vida, sem espaço para a tristeza. Só para a beleza, o lado lúdico, com alegria no coração", conclui ele, lembrando que se inspirou na mãe, Thereza Carvalho, para começar a pintar: "Ela tem dez mil quadros, a maioria vendidos. Comecei a ver a alegria dela com a arte e resolvi experimentar".