17/06/2011
Cedae: esgoto clandestino é o grande problema do Rio Carioca
Entrevista com Jorge Briard, diretor de Produção e Grande Operação da Companhia Estadual de Águas e Esgotos
Por Flávia Ribeiro
O estado das águas do Rio Carioca é uma preocupação constante para os moradores de Cosme Velho, Laranjeiras e Flamengo. Principal fornecedor de água potável na cidade até o século XVIII, há décadas o rio vem sofrendo com ligações clandestinas de esgoto. Diretor de Produção e Grande Operação da Companhia Estadual de Águas e Esgotos (Cedae), Jorge Briard conta que o Rio Carioca é um dos próximos que serão beneficiados por um programa de identificação e erradicação de pontos clandestinos e despoluição dos rios da Zona Sul da cidade, fruto de uma parceria entre a Cedae e a prefeitura. Mas ressalva que assim que o poder público sai de cena, novas ligações são feitas. "Quando você tem na cabeceira dos sistemas pluviais comunidades como o Cerro Corá e o Guararapes, é complicado. Você faz as intervenções, mas logo surgem mais barracos que fazem lançamentos clandestinos acima da capacidade do sistema", afirma, lembrando que o mau uso dos aparelhos sanitários pela população em geral da cidade só contribui para a degradação da rede pluvial: "As pessoas jogam tudo nele, de absorventes e camisinha a cotonete e cabelo. A solução passa por educação".
Os pontos de esgoto clandestinos do Rio Carioca estão identificados? Há um projeto para isso?
Essa questão do esgoto clandestino é como cachorro correndo atrás do rabo. Há uns dez anos, retiramos todas as ligações clandestinas. Mas as pessoas voltam a fazer os desvios para as galerias pluviais, e é um problema fazer essa identificação. Só dá para fazer quando você tem uma evidência grande de despejo em praia ou lagoa. Na Lagoa Rodrigo de Freitas, a gente tem sensores em todas as galerias de águas pluviais. No caso da Bacia do Flamengo, a gente identifica quando o pessoal da estação de tratamento de esgoto avisa que houve um aumento na chegada de esgoto em tempo seco. Normalmente, o esgoto é coletado num interceptor oceânico. Se você tem um lançamento de esgoto acima do normal, que passa pelo interceptor, a gente é acionado e corre atrás do problema.
Você falou na chegada de esgoto em tempo seco. Pode explicar melhor?
Nós temos pontos de captação que costumam interceptar o esgoto normal, de tempo seco, antes de ele ser despejado nas praias e lagoas. Temos uma equipe permanente que faz estudo de vazão em tempo seco, para ver onde tem lançamento irregular. É diferente de época de chuva. Com chuva forte, passa tudo. Isso não é um problema só do Rio de Janeiro, cidades europeias como Barcelona (Espanha) têm sempre avisos como "não tomar banho de mar nas 48 horas seguintes à chuva".
Mas acontecem vazamentos em tempo seco?
Não é o normal, a gente está sempre observando. Mas quando você tem na cabeceira dos sistemas pluviais comunidades como o Cerro Corá e o Guararapes, é complicado. Você faz as intervenções, mas logo surgem mais barracos que fazem lançamentos clandestinos acima da capacidade do sistema. O Rio Carioca é dividido. Das Paineiras até o início de Santa Teresa, a qualidade da água é boa. A partir dos Guararapes e do Cerro Corá, começam os lançamentos. No Rio Carioca, o problema é realmente o esgoto clandestino. Em outras áreas da cidade, há outros problemas.
Que tipo de problemas?
O cara não limpa a caixa de gordura, ela entope, ele faz um gatilho e liga na galeria pluvial do prédio dele. Em Botafogo e no Centro, muitas residências viram restaurantes. Para isso, o sujeito tem que ir à Cedae registrar a modificação de uso, para a companhia fazer as mudanças necessárias. Mas ele não faz isso porque a taxa de água em residência sai em média a R$ 35, e a comercial sobe para cerca de R$ 170. O óleo de cozinha, por exemplo, vai direto para o ralo. A quantidade de gordura, muito alta, vira uma bola uniforme que causa extravasamento de esgoto na rua. Há a má educação geral no uso dos aparelhos sanitários: as pessoas jogam tudo nele, de absorventes e camisinha a cotonete e cabelo, e isso se une à bola de gordura, provocando rompimentos na rede. A solução passa por educação. Nossa rede é robusta no Centro e na Zona Sul, por exemplo. Limpa, não tem problema. O problema é que não é limpa.
Quais são os projetos da Cedae para a despoluição do Rio Carioca?
Nós fazemos um trabalho conjunto com a prefeitura, um projeto em todos os rios da Zona Sul, de limpeza e identificação de pontos clandestinos. Começou há dez anos, justamente com o Rio Carioca. Nós estamos agora no Rio Rainha, que deságua no canal da Avenida Visconde de Albuquerque e na Praia do Leblon. É o último, e deve acabar em agosto. Depois disso, devemos voltar ao começo, voltar ao Rio Carioca.
Na altura do ponto final do Cosme Velho e no Dataprev, o esgoto sempre sobe e derrama quando chove. Muitos moradores acreditam que é o Rio Carioca que sobe, e que como rio e esgoto se confundem na região, eles se misturam e vazam para a rua. É isso mesmo que acontece?
Isso é resultado do lançamento de esgoto em galeria pluvial. Com a chuva, retornam para as ruas a água da chuva junto com os lançamentos clandestinos. Fazemos um trabalho contínuo em relação a isso. A cada denúncia, a gente investiga. E o pessoal da unidade de tratamento está sempre observando.
Qual é o estado, hoje, das águas do Rio Carioca? É, como se diz, um rio de cocô?
Não é uma água cristalina, os níveis de coliformes fecais estão acima do ideal. Precisa de um trabalho. Mas não chega a ser o Rio Acari, não está completamente tomado de esgoto. Dizer que o Rio Carioca é um rio de cocô é um exagero.