11/06/2010
ORIGENS
Sentei na varanda, caneca na mão, olhos esfregados quando em vez, bocejos e mais bocejos, tentativa às vezes vã de expulsar os extenuantes acúmulos do cotidiano.
Manhã clara, fria e silenciosa.
Tão silenciosa quanto a fumaça do café, que subia sinuosa.
Aos poucos, cores e acordes.
Sentidos despertando,
sinais da vida a passar.
As mãos da filha mais nova, tocando meus cabelos, os brancos e os amarelados pelo tempo que ainda teimam em grudar na cabeça, anunciam a sequencia do dia.
_ "Pai !?"
A saudação ecoa nos devaneios da manhã.
Ela tem dezessete. Os outros, vinte oito e trinta.
Admito que em determinadas horas me trazem aflição.
Meu tanto de vida a passar me autoriza a contar o tempo pelos passos das formigas de carregação, pelas batidas de asas dos beija-flores, pelo amarelo do outono e pelas cores da primavera, pela vazante e pela cheia do riacho que corre aqui em casa.
Meu tanto de vida passado, que me faz hoje um pai, exclamado e interrogado, me exige a contagem do tempo pelas oportunidades a oferecer, dúvidas a esclarecer, experiências a transmitir, bolsos e coração abertos, torcida para que tudo dê certo.
_ "Pai !?"
Despertar por tão carinhosa forma é fato incomum nestes tempos e mundos de sistemas e afazeres, conjunções econômicas, conjunturas políticas.
_ "Pai, o jogo já começou, voce não vai assistir?"
Lembro de ter assistido com ela a festa do início da Copa ontem, e do quanto significa para o Mundo esta festa africana.
Do resgate da cidadania ao resgate da humanidade, das origens africanas da humanidade.
Das origens de n sergio.
Do show de Desmond Tutu.
Do sorriso do Nelson Mandela.
Um canarinho pousou na varanda.
Começa um segundo tempo.
Vuvuzelas.
Um golaço da África do Sul.
E,
Quando vi a galera aplaudindo de pé as tabelas
"Eu jurei que era ela que vinha chegando
Com minha cabeça já pelas tabelas
Claro que ninguém se importa com minha aflição
Quando vi todo mundo na rua de blusa amarela
Eu achei que era ela puxando o cordão"
(Pelas Tabelas - Chico Buarque)
Sergio Castiglione