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© 2005 Isabel Vidal
Todos os direitos reservados



27/11/09 - AOS ADOLESCENTES - II


MATAR OU MORRER

Depois de 32 anos lidando com crianças, me dou conta de que a maior parte de minha clientela é formada de adolescentes e adultos jovens, muitos já me trazendo seus filhos para que eu também os acompanhe. Tenho pacientes cuja idade é idêntica ao tempo que tenho de exercício profissional.

Seria uma tolice acreditar que eu cuido deles, os ensino ou acompanho.

Na realidade nós trocamos informações, e eu também venho aprendendo com eles, sobre a vida e sobre doenças. Nos fazemos companhia, e percebo muitas vezes que eles zelam e cuidam de mim.

Por estas razões os assuntos ligados à Adolescência, para cuja faixa etária existe hoje inclusive uma especialidade médica denominada Hebiatria (tenho um filho especialista nesta área), se tornaram corriqueiros e parte importante do meu cotidiano.

Não sou apegado a bens materiais.

O que tenho de mais valioso para legar aos meus filhos, aos meus jovens pacientes e aos filhos deles é a possibilidade de pensar, discutir, agir, modificar, em busca de dias felizes.


A NOTÍCIA (do site yahoo)

A cada mil jovens, 5 serão assassinados, diz pesquisa
Ter, 24 Nov, 03h46

Estudo coordenado pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública e apresentado hoje em São Paulo mostra que a cada mil jovens brasileiros, cinco morrerão assassinados antes dos 24 anos. Na faixa de 12 a 18 anos, a estimativa é que 2,38 jovens morram antes de completarem 18 anos. Entre jovens adultos, de 25 a 29, a expectativa de morte é de 3,73 jovens entre mil. O Fórum é uma organização não governamental apartidária de suporte à gestão da segurança pública no País.

A pesquisa foi realizada nos 266 municípios brasileiros com mais de 100 mil habitantes, classificados de acordo com o Índice de Vulnerabilidade Juvenil (IVJ). Usando metodologia criada pelo Laboratório de Análise da Violência da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj), o estudo mostra relação direta entre violência e inserção no mercado de trabalho e escolaridade.

A faixa de jovens com idades entre 18 e 24 anos que não realizam funções remuneradas e não estudam formam o grupo no qual a taxa de mortalidade é maior. O indicador também confirma que aqueles que residem em moradias precárias, como as favelas, são os mais expostos à violência.

Em municípios com o Índice de Vulnerabilidade Juvenil muito alto (acima de 0,50), a taxa de mortalidade por homicídio chega a 11 jovens de 19 a 24 anos por mil. O perfil do jovem mais exposto à violência é o mesmo do encontrado em outras pesquisas do tipo: jovem, homem, negro.

O estudo revela, ainda, que os municípios que menos investem em segurança pública são aqueles onde os jovens estão mais expostos à violência. Naqueles onde o IVJ é muito alto, o gasto com segurança pública, em 2006, foi de R$ 3.764 por mil habitantes, enquanto nas cidades com IVJ baixo a aplicação foi de R$ 14.450 por mil habitantes.


O COMENTÁRIO

Os dados são alarmantes.

Mostram aquilo que todos sabemos, de forma consciente ou não, sobre a origem da violência, quanto aos grupos sociais mais atingidos, e às faixas etárias predominantes.

Entretanto, o texto não aborda com a adequada veemência o fato de que segurança pública depende basicamente (para não falar exclusivamente) de fatores de redução das desigualdades sociais, tais como:

Habitação - Pensem sobre as condições de moradia de quem vive em favelas, submetidos aos ditames de governos paralelos e aos flashs eleitoreiros do governo legal com suas Madonas.

Educação - Reflitam sobre as possibilidades de quem depende do ensino público básico, ainda tecnologicamente atrasado, em que escolas se transformam por vezes em restaurantes da única refeição diária.

Saúde - Quem pode estar satisfeito com uma saúde pública fatiada e politizada, com uma saúde "particular" alternativa (planos de saúde) de preços aviltantes e qualidade tão baixa quanto a pública? Paga-se dobrado por um serviço (desconto para o INSS e plano de saúde). Em alguns casos, o pagamento é triplicado, como nas escolas que mantém acordos operacionais com empresas de seguro ou de saúde escolar para atendimento médico de "emergência????"

Trabalho - Quando os três itens acima vão mal, o que se vai conseguir na hora de ingressar no mercado de trabalho? Aqui, trabalhamos 44 horas por semana, sustentados por um ridículo salário mínimo que abre espaço para o vilipêndio de um outro valor (até 1,2 vezes maior) que é agregado ao salário como impostos (para aquela habitação, aquela saúde, aquela educação pública) e benefícios sociais (auxílios e bolsas das mais variadas origens, que na realidade deveriam compor o salário tornando-o digno).

Trabalhamos em empresas multinacionais de países onde a carga horária de trabalho semanal varia de 36 a 40 horas, que se instalam em nosso território com isenções fiscais (menos impostos para as demandas públicas e mais propina para governantes), que poluem nosso meio ambiente, engordando os recursos da elite e dos países que detém as ações destas empresas (por certo não somos nós), e que com estes recursos extras põem se dar ao luxo de trabalhar menos, ganhar mais, ter melhor habitação, melhor saúde, melhor educação, mais cultura, mais lazer e....., e o ciclo se fecha.

Voltando à notícia, fica para meus filhos, para meus jovens pacientes, e para os que pacientemente leram tudo isso o enigma que necessita de uma solução que parta de vocês.

O estudo mostra que são vocês que morrem.

Quem puxa o gatilho?


Sergio Castiglione






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